Violência

Dois policiais da Rota viram réus na Operação Escudo acusados de matar homem desarmado e plantar pistola na cena do crime

Jefferson Junio Ramos Diogo levou 4 tiros na noite de 29 de julho de 2023 em Guarujá. Segundo Ministério Público, agentes sabiam que homem estava desarmado e simularam apreensão de pistola.

Por Arthur Stabile, g1 — São Paulo

 

Câmeras dos PMs registraram ação com diálogos forjados, segundo o MP — Foto: Reprodução

Câmeras dos PMs registraram ação com diálogos forjados, segundo o MP — Foto: Reprodução

A Justiça de São Paulo tornou réus 2 policiais militares das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), a tropa de elite da PM paulista, por matar um homem e simular que ele estava armado durante a Operação Escudo, em julho de 2023, na Baixada Santista.

Segundo a denúncia do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), na noite de 29 de julho de 2023, os policiais militares Rafael Perestrelo Trogillo e Rubem Pinto Santos mataram Jefferson Junio Ramos Diogo, de 34 anos, em uma favela localizada na Rua Quatro, número 1, em Guarujá.

À época da morte, pessoas próximas disseram ao g1 que Jefferson era dependente químico e vivia em situação de rua.

Jefferson Junio era dependente químico e vivia em situação de rua, segundo pessoas próximas — Foto: Arquivo Pessoal

Jefferson Junio era dependente químico e vivia em situação de rua, segundo pessoas próximas — Foto: Arquivo Pessoal

O g1 questionou a Secretaria da Segurança Pública (SSP) de São Paulo, administrada pelo ex-PM de Rota Guilherme Derrite, e não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.

Entenda o caso

 

Os PMs alegaram que Jefferson apontou arma para os policiais e que, por isso, dispararam 11 vezes e o atingiram. Após baleado, ainda segundo os policiais, Jefferson fugiu e, ao ser encontrado novamente, ainda portava a arma. Um dos policiais, então, efetuou mais 4 disparos. Depois, os PMs afirmam ter apreendido com ele uma pistola .40 com 8 munições, um carregador de pistola 9mm e porções de drogas em uma mochila.

Laudo necroscópico obtido pelo g1 aponta que Jefferson levou quatro tiros – um no queixo, um na coxa esquerda; um no braço direito e um nas costas.

Laudo indica que Jefferson Junio levou tiro pelas costas durante o tiroteio — Foto: Reprodução

Laudo indica que Jefferson Junio levou tiro pelas costas durante o tiroteio — Foto: Reprodução

Segundo o MP, entretanto, Jefferson estava desarmado e os PMs sabiam disso. Por isso, para evitar a responsabilização, “realizaram gestos dissimulados e diálogos referentes à arrecadação de uma pistola, posteriormente apresentada à Autoridade Policial [Polícia Civil]”.

“Os denunciados, mesmo com câmeras operacionais, não hesitaram simular a apreensão de uma pistola ao lado do corpo de vítima que, em verdade, estava desarmada”, diz trecho da denúncia apresentada pelo Ministério Público obtida pelo g1.

 

Ainda de acordo com a denúncia, para evitar que a câmera corporal registrasse que Jefferson estava desarmado, o policial Rubem Pinto Santos se colocou e lado para a cena.

g1 acionou a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo e tenta contato com os advogados dos PMs.

Outros dois policiais participaram da ação. Um não foi denunciado pelo MP. O outro policial era Samuel Wesley Cosmo, que foi morto na Operação Verão em 2 de fevereiro deste ano.

Afastamento para trabalho administrativo

 

Em decisão, o juiz Edmilson Rosa dos Santos recebeu a denúncia do Ministério Público de São Paulo e determinou o afastamento dos PMs Rafael Perestrelo Trogillo e Rubem Pinto Santos.

A Justiça definiu que os policiais da Rota devem sair da atividade operacional nas ruas para cumprir trabalho administrativo enquanto respondem à acusação.

Para o magistrado, afastar a dupla da rua é “medida cautelar que se mostra proporcional e razoável para evitar-se quaisquer eventuais alegações de temores de retaliações testigos ou de pessoas ligadas ao caso ou a localidade que se deram os fatos”.

Operação em 2024

 

Escudo foi o nome dado pelo governo de São Paulo à operação realizada entre julho e setembro de 2023 na Baixada Santista após a morte um policial militar na região.

Durante a operação, 28 pessoas foram mortas.

Em 2024, com novas mortes de PMs na região, o governo voltou a realizar operações na Baixada – desta vez, batizadas de Verão. Na que vigiu entre 3 de fevereiro e 1º de abril, 56 pessoas foram mortas em ações policiais.

Funcionários de unidades de saúde da Baixada contaram ao g1 que pessoas baleadas pela Polícia Militar (PM) na Operação Verão já estavam mortas quando foram socorridas – o que torna mais difícil constatar se houve homicídio ou morte decorrente de intervenção policial em confronto.

Com as operações na Baixada, as mortes cometidas por policiais subiram 86% no primeiro trimestre de 2024, segundo ano do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) em São Paulo.

À época, entidades de direitos humanos denunciaram na Organização das Nações Unidas (ONU) o governador Tarcísio e o secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite. Tarcísio rebateu:

“Sinceramente, nós temos muita tranquilidade com o que está sendo feito. E aí o pessoal pode ir na ONU, pode ir na Liga da Justiça, no raio que o parta, que eu não tô nem aí”, disse o governador.

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